sexta-feira, 3 de outubro de 2008

Impermanência

A impermanência é a virtude da realidade. Exatamente como as quatro estações, sempre em contínuo fluxo — o inverno transformando-se em primavera e o verão em outono. Assim como o dia torna-se noite, a luz torna-se escuridão e luz mais uma vez — da mesma forma, tudo se transforma constantemente. A impermanência é a essência de tudo. Bebês transformam-se em crianças, adolescentes, adultos, velhos e, em algum ponto do caminho, morrem. Impermanência é encontrar-se e separar-se. É apaixonar-se e desapaixonar-se. A impermanência é doce e amarga, como comprar uma camisa nova e, anos mais tarde, vê-la transformada em um pedaço de uma colcha de retalhos. [...] A impermanência é o princípio da harmonia. Quando não lutamos contra ela, estamos em harmonia com a realidade. Muitas culturas celebram esse vínculo. Existem cerimônias marcando todas as transformações da vida, do nascimento à morte, assim como encontrar-se e separar-se, ir à guerra, perder a guerra, vencer a guerra. Nós também podemos reconhecer, respeitar e celebrar a impermanência.

(Pema Chödrön, Quando Tudo Se Desfaz)

Algumas pessoas acham que o buddhismo é pessimista, sempre falando de morte, morrer, impermanência, velhice — mas isso não é necessariamente verdade. A impermanência é um alívio! Eu não tenho uma BMW hoje e é graças à impermanência desse fato que eu posso vir a ter uma amanhã. Sem a impermanência eu ficaria preso à não-posse de uma BMW e nunca poderia vir a ter uma. Eu posso estar me sentindo muito deprimido hoje e, graças à impermanência, amanhã eu posso estar me sentindo ótimo. A impermanência não é necessariamente uma má notícia; tudo depende de como a interpretamos e a compreendemos. Mesmo que hoje nossa BMW seja riscada por um vândalo ou que nosso melhor amigo nos deixe na mão, não vamos ficar tão preocupados assim. Quando não reconhecemos que toda coisa composta é impermanente, isso é um engano, uma ilusão. Quando compreendemos isso — e não só intelectualmente — ficamos livres desse engano. É a isso que chamamos de liberação: ficar livre da crença unidirecionada e bitolada de que as coisas são permanentes. Mesmo o caminho, o precioso caminho buddhista, também pertence à esfera do composto, quer gostemos disso ou não. Ele tem um começo, tem um fim, tem um meio.

Dzongsar Khyentse Rinpoche, Os Quatro Selos do Dharma)

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